PSICANÁLISE INFANTIL.

Nestes últimos dias, por inumeras situações, o assunto "Psicanálise Infantil" vem a discussão e troca de idéias. Rememorando alguns aspectos, autores e teses, resolvi postar alguns esclarecimentos anotados por alguns mestres, para quem sabe, trazer uma visão mais externalista da questão, ajudando assim a quem, por algum motivo pessoal, necessita destas informações.
Este post, não tem (nem nunca terá nenhum outro) caráter diagnóstico, mas o exercício do conhecimento, por vezes nos faz melhores e menos aceitadores de "fórmulas miraculosas".





Nos dias atuais, a violência marginal, doméstica e a decorrente do trânsito tem sido cada vez mais constante nas manchetes de jornais. E, o resultado disso é um número cada vez mais crescente de famílias desfilhadas, angustiadas e desestruturadas.

No meio de tudo isso, a criança se torna vítima direta ou indiretamente dessa violência, seja por que, perdeu entes queridos e próximos, seja por que ela mesma foi vítima por meio de abusos psicológicos, físicos e/ou sexuais, numa grande maioria das vezes, provocados por seus familiares mais próximos.

É fato, porém, que estas crianças não são vítimas apenas desse tipo de violência. Muitas são as crianças que se sentem indesejadas por não terem sido planejadas por seus pais; e, ainda, há o problema da ausência dos pais em razão de seus trabalhos que os mantém muito tempo longe de suas casas e de seus filhos, os quais, acabam sendo criados em creches, ou por avós ou babás, resultando em famílias totalmente desestruturadas, tendo seus filhos como principais vítimas de toda essa falta de estrutura.

A primeira análise realizada com uma criança foi a do Pequeno Hans (Sigmund Freud, em 1909) e teve grande importância por demonstrar que os métodos psicanalíticos podiam ser aplicados também às crianças. Naquela ocasião, Freud já mencionava que a criança é psicologicamente diferente do adulto, não possuindo ainda um Superego estruturado.
Para ele, as resistências internas que combatemos no adulto ficam substituídas
na criança por dificuldades externas.
Ego deve a sua origem, bem como as suas características adquiridas mais importantes, aos seus contatos com a realidade, com o mundo externo. Daí os estados patológicos do Ego — nos quais se reaproxima do Id — resultarem da cessação ou afrouxamento com o mundo externo (...). O Ego pode tornar-se o seu próprio objeto, dispensando a si mesmo o tratamento que dispensaria aos demais... (KARL WEISSMANN).

Em relação aos fatores externos, o Ego cumpre essa função registrando, reagindo aos estímulos que lhe vem de fora, acumulando experiência em relação aos mesmos [pela memória], evitando excessos de estímulos [pela fuga], lidando com os estímulos moderadamente [via adaptação], e, finalmente, operando mudanças apropriadas no mundo externo em seu benefício [via atividade] (WEISSMANN, 1976).

Fazendo citação a Freud, diz que o Ego não é impulsionado apenas pelas forças do Id; explicando que Freud admitia que o Ego era também alimentado por outras forças, além das instintivas. E que, segundo ele, todos os conceitos de Ego e de Id relacionam-se aos pais e à nossa longa infância, eroticamente fixada aos mesmos, gerando as complicações do complexo de Édipo. E, diz que da identificação, mais ou menos problematizada, com os progenitores e com as figuras que são representantes da série materna e paterna, resulta a formação do Ideal do Ego, também chamado Superego. As perturbações sofridas nesse processo resultam as notórias crises de identidade, bem como os fenômenos de múltipla personalidade, e complicações de outra ordem.
À medida que vai se desenvolvendo, a criança se vê diante de certas demandas do meio que persistem sob forma de normas e regras estabelecidas. Estas regras e normas pertencentes ao mundo externo acabam por se incorporar em sua estrutura psíquica, constituindo assim seu Superego, representando uma espécie de resposta automática do “certo” e do “errado”, que surge na pessoa diante das várias situações, nas quais deve tomar uma decisão.

O Superego se equacionou ao medo dos pais incorporado à consciência inconsciente do indivíduo. A mais ou menos temida autoridade parental que era externa e passou a ser interna, transformada na voz interior que repete monotonamente os velhos mandamentos familiares.
Dessa forma, o Superego trata-se de uma representação internalizada dos valores e costumes da sociedade.

Mas, para que haja um bom equilíbrio, surge a necessidade da existência de um Ego fortalecido, de um Superego moderado e do conhecimento da natureza e dos impulsos do Id.


Nesta altura da leitura é importante lembrar que O complexo de Édipo se deve ao tabu do incesto e à ignorância acerca de sua repressão subsequente” (...) e “costuma ser o mais fortemente responsável pelos dissídios no matrimónio e incompatibilidades nas relações conjugais e problemas conexos, como prostituição, limitação de prole, etc. no individuo maduro.  A experiência analítica tem mostrado quão dificilmente uma mulher com forte fixação paterna consegue a felicidade no casamento, como por sua vez, um homem fixado eroticamente na pessoa materna. Não é, por certo, muito lisonjeiro à vaidade feminina, e nem tão pouco à masculina, o ensinamento segundo o qual os sentimentos do homem para com a mulher, responsáveis pela sua escolha matrimonial ou pelas ligações extraconjugais, são, independentemente de um complexo de Édipo em grau patológico, sempre influenciados por sua ligação remota com a mãe”. (...)  
Com as devidas restrições, podemos concordar com o ponto de vista de Maxwell Gitelson, para quem o complexo de Édipo (desde que não atinja um nivel muito patológico) não constitui unicamente a causa nuclear das neuroses, mas também base para a formação de um caráter normal e de uma maturação sadia”. 



Os problemas, no entanto, centram-se na castração nos homens, e na inveja do pênis, nas mulheres. Outro importante foco de distorções evolutivas nesse período deriva-se dos padrões de identificação desenvolvidos sem a resolução do complexo de Édipo. A influência da ansiedade de castração e a inveja do pênis, as defesas contra ambas, e os padrões de identificação que surgem na fase fálica são os determinantes primários do caráter humano. Também incluem e integram os resíduos de estágios psicossexuais anteriores, de modo que as fixações ou conflitos derivados de quaisquer estágios precedentes podem contaminar e modificar a resolução edípica (KAPLAN & SADOCK )

NEUROSE INFANTIL

É de fácil constatação a neurose de abandono numa criança quando seu pai ou mãe se afasta por alguns instantes. O desespero que esta demonstra parece nos dizer o quanto tem medo de que venha a ser abandonada por estes.

Pergunta-se: estaria isso ligado a incerteza de não ser amada”? Um outro fator que poderíamos considerar seria se esta criança é filha de pais, que por razões variadas, acabam se tornando muito ausentes. E, ainda deve ser considerado o próprio trauma do nascimento, ocasião em que se deu a expulsão do útero, que num parto não tão tranqüilo seria mais agravado talvez ocasionando essa neurose de abandono. Muitas são as possibilidades, mas é fato a evidência dessa neurose em muitas crianças.



AVALIAÇÃO DAS NEUROSES INFANTIS, SEGUNDO ANNA FREUD

De acordo com Anna Freud, a presença ou a ausência de sofrimento não pode ser tomada como fator decisivo quando se decide acerca de um tratamento de uma criança. E, alega que há muitos distúrbios neuróticos sérios que as crianças suportam com ânimo firme; além de outros menos sérios que provocam sofrimento.

Segundo ela, somente quando os sintomas da criança são conturbadores para o meio em que vive e, afetam diretamente os pais, há uma probabilidade maior destes procurarem um profissional da psicanálise para tratar de seus filhos.

E, completa dizendo que os pais se mostram mais preocupados, por exemplo, com os estados de agressividade e de destrutividade dos filhos do que com as inibições; os atos obsessivos são considerados mais leves do que as crises de ansiedade, embora, na verdade, representem eles, um estágio mais avançado do mesmo distúrbio; os estágios iniciais da passividade feminina nos meninos, embora freqüentemente decisivos para sua futura anormalidade, são quase que invariavelmente deixados despercebidos.
Em virtude disso, Anna Freud sugere que o analista avalie a seriedade de uma neurose infantil, não em virtude da criança de uma forma especial qualquer, ou em um dado momento, mas em virtude do grau em que não permita à criança o seu desenvolvimento posterior.



CRIANÇA E SEU LUGAR EQUIVOCADO NO SEIO FAMILIAR

Ocorre que muitas mães não se desvincularam de seu papel de filha e ainda não assimilaram sua condição materna; por conseqüência, o filho acaba por não ter espaço para ser filho. Essa situação traz um desconforto e também um certo prazer, visto que o filho passa a desempenhar uma função de companheiro. Prazer porque lhe é agradável tal posição e, desprazer, justamente por não lhe ser dado o direito de desempenhar sua condição de filho.
Com isso o filho acaba por se tornar objeto da mãe, um vínculo que para ser
quebrado depende da atuação paterna forte, desempenhando seu papel de pai e marido.

São inúmeras as razões que levam pais ou responsáveis a procurar terapia
para suas crianças, dentre as quais, destaco:
Baixo rendimento escolar.
Comportamentos agressivos,
Timidez.
Enurese noturna.
Hiperatividade.
Dificuldades de interagir com outras crianças ou familiares.
Depressão.

É importante que o analista observe por meio de uma atenção flutuante os sintomas apresentados pela criança, o que significa dizer que deve procurar captar tudo que o analisando quer dizer sem se focar num único tema.

Ainda na hora de analisar os sintomas apresentados pela criança, o analista deverá abster-se de pré-julgamentos, a fim de, seja possível uma interpretação condizente ao caso e, deverá ter o cuidado de nunca ver seu paciente como a um filho, além é claro, de atentar para o fato de que as crianças possuem grande sensibilidade para assumirem os sintomas e a angústia específica de seu grupo familiar e, os confrontará juntamente com seus próprios conflitos.



DIFERENÇAS DO TRATAMENTO ANALÍTICO (ADULTO / CRIANÇA),
SEGUNDO ANA FREUD

Segundo Ana Freud, a análise de crianças exige um período preparatório que não se verifica na análise de adulto. E esse período nada tem haver com o trabalho analítico, visto que, não se trata ainda de tornar conscientes os processos inconscientes ou de exercer influencia analítica sobre o paciente. Trata-se simplesmente de buscar estabelecer um laço entre o psicanalista e a criança.

Ela considerava as crianças muito frágeis para submeterem a uma análise e não acreditava que elas pudessem desenvolver a transferência e nem tão pouco associar livremente, devido a sua imaturidade psíquica. E dizia que o Complexo de Édipo não deveria ser examinado muito profundamente em função da imaturidade do Superego. E, também com base nesse raciocínio, ela defendia que a abordagem psicanalítica deveria vir associada a uma ação educativa (pedagogia psicanalítica).

E, em uma de suas exposições forneceu um balanço dos elementos através dos quais se pode apreender o inconsciente infantil. Ela esclarece que os melhores e mais adequados expedientes da análise de adultos não se aplicam à analise de crianças, e que devemos nos afastar de muitas exigências impostas pela teoria cientifica e lançar mão de nosso material onde quer que o encontremos – de maneira muito parecida com a de que lançamos mão habitualmente, quando pretendemos penetrar na vida privada de uma determinada pessoa. A criança, segundo Ana Freud, mostra-se menos apta a extrair material inconsciente.

Ela adverte que o analista deve se esforçar-se por se colocar no lugar do Ego- Ideal da criança por toda a duração da análise; não deve principiar sua tarefa analítica de liberação até que se tenha assegurado de que a criança esteja ávida por seguir seu comando.

Segundo ela, o analista precisa ser apto a controlar o relacionamento entre o Ego da criança e os seus instintos e, esclarece que o Superego da criança é fraco; visto que, as exigências do Superego, assim como a neurose, acham-se em dependência do mundo exterior, esclarece ainda, que a criança é incapaz de controlar os instintos liberados e de que o analista em pessoa precisa dirigi-los.